O poder da cultura organizacional

Uma pessoa jurídica tem personalidade tanto quanto uma pessoa física, possuindo um jeito de ser, uma maneira de comportar-se, uma forma de agir frente aos problemas, enfim, uma cultura totalmente própria, personalíssima. Quando a empresa é muito pequena, o fundador ou principal executivo consegue exercer influência sobre os poucos funcionários que trabalham juntos, tornando-se mais fácil haver uma cultura única implantada de forma homogênea.

Porém, o desafio acontece quando a empresa cresce, quando passa a ter mais pessoas trabalhando juntas, onde cada um tenta implantar a sua forma de ser ao invés da cultura da companhia: quando o organização vai perdendo a sua identidade original, uma série de problemas começam a acontecer, chegando até aos clientes, prejudicando com isso o desempenho da organização.
 
Cultura Organizacional é a cultura no seu sentido antropológico, presente em uma companhia composta por comportamentos, valores éticos e morais, práticas habituais, símbolos utilizados, crenças, políticas internas, princípios; enfim, a cultura organizacional influencia as pessoas da organização para guiar seus comportamentos e mentalidades. Quanto mais a cultura seja percebida pelo mercado (clientes) mais haverá fidelização e identificação com a marca.
 
Esta cultura é dinâmica, modifica-se em função de várias circunstâncias, necessitando que todos estejam alinhados continuamente. Desta forma, não é algo que se implanta, é algo que precisa ser mantido continuamente. É muito importante que a empresa tenha um guardião da cultura, alguém que tenha a missão de manter a cultura viva o tempo inteiro. Normalmente este papel é do fundador ou principal executivo, mas quanto mais a empresa cresce,
mais é importante que os líderes intermediários, como diretores, gerentes e supervisores também cumpram o papel de difundir e manter a cultura vigente.
 
Como fundador da Alterdata Software, uma empresa de desenvolvimento de programas de computador fundada em 1989, e que em 2013 estava com 30.000 clientes e mais de 1.000 colaboradores, percebo o quanto é relevante e complexo manter a cultura viva paralelamente ao crescimento acentuado. Muitas empresas deixaram de existir simplesmente porque foram perdendo o foco na medida que cresceram, o que é um grande risco. Na Alterdata sabemos desta armadilha e nos precavemos continuamente para garantir que a essência da empresa não seja perdida jamais, ministrando muitos treinamentos e fazendo com que os fundadores tenham contato regular com os demais líderes da empresa, de tal forma que sempre a cultura e os objetivos estejam sendo passados a todos.  O principal executivo, mesmo que seja o dono de uma empresa com cinco funcionários, precisa entender que parte da função dele é difundir e manter viva a cultura da organização, sendo esta uma das coisas mais difíceis de serem delegadas.
 
Toda empresa possui uma Cultura Organizacional, esteja esta implantada formalmente ou não, e conhecê-la em detalhes fará com que se consiga subir na carreira mais facilmente, de vez que se estará mais alinhado com os valores da organização, independente do fato de você gostar ou não, concordar ou não, aceitar ou não. Um antigo provérbio diz: “O bom é saber que sabe. Melhor ainda é saber que não sabe. Providencial é saber sem se dar conta. Mas o pior é não saber que não sabe.”
 
Se você trabalha numa empresa que não tem esta cultura implantada formalmente, deveria procurar convencer os superiores a criar o conteúdo necessário para garantir que todos conheçam a cultura em que estão inseridos, ensejando que seja plenamente instituída a formalização da cultura, algo indubitavelmente de extrema importância, criando assim uma oportunidade de mostrar o quanto você pode agregar ao negócio.
 
Para melhor compreender, pesquisei em inúmeros autores quais são as vertentes de que uma empresa dispõe para formar a sua cultura, tentando entender que elementos podem contribuir para que a cultura seja formada, o que me levaria até Edgar Schein, um dos maiores responsáveis pela divulgação e desenvolvimento do conceito.  Acredita ele que o fenômeno complexo da cultura organizacional é formado por três níveis de conhecimento:
Artefatos. Constituem o primeiro nível da cultura, o mais superficial, visível e perceptível. São as coisas que cada um vê, ouve e sente quando se depara com uma organização cuja cultura não lhe é familiar. Artefatos são todas aquelas coisas que,  em conjunto, definem uma cultura, e revelam, reciprocamente,  como a cultura dá atenção a elas. Incluem produtos, serviços e os padrões de comportamento dos membros de uma organização. Quando se percorrem os escritórios de uma organização, pode-se notar como as pessoas se vestem, como falam, sobre o que conversam, como se comportam, quais as coisas que são importantes e relevantes para elas. Os artefatos são todas as coisas ou eventos que podem nos indicar visual ou auditivamente como é a cultura da organização. Os símbolos, as histórias, os heróis, os lemas, as cerimônias anuais são também exemplos de artefatos.
Valores compartilhados. Constituem o segundo nível da cultura. São os valores relevantes que se tornam importantes para as pessoas e que definem as razões pelas quais elas fazem o que fazem. Funcionam como justificativas aceitas por todos os membros. Em muitas culturas organizacionais, os valores são criados originalmente pelos fundadores da organização. Na DuPont, muitos dos procedimentos e produtos são resultantes dos valores atribuídos à segurança. É que a organização foi criada por um fabricante de pólvora para armas, e não surpreende que tenha procurado fazer esse trabalho com total segurança, assim orientando novos membros que ingressavam no negócio. Os valores de segurança são traços fortes da cultura da DuPont desde os tempos em que a pólvora era o centro de seus negócios.
Pressuposições básicas. Constituem o terceiro nível da cultura organizacional, o mais íntimo, profundo e oculto.  São as crenças inconscientes, percepções, sentimentos e pressuposições dominantes em que os membros da organização acreditam.  A cultura prescreve “a maneira certa de fazer as coisas” adotada na organização, muitas vezes através de pressuposições não escritas e nem sequer faladas. Muitas empresas de cosméticos assumem previamente que toda estratégia de marketing deve focalizar a propaganda - e promoções sobre seus produtos visam, afinal, aumentar a beleza das mulheres.
 
Buscando mais informações de outros autores, consegui reunir alguns elementos que passo a descrever como relevantes para o processo de formar a cultura, e sugiro que, ao ler, você reflita gradativamente quais elementos são pertinentes à empresa em que trabalha:
- Foco no cliente:
Empresa que se preocupa bastante com o resultado apresentado ao cliente, não apenas mediante o que fala nos folders promocionais, mas essencialmente através do que acredita.  Existem empresas que falam que o cliente é importante, mas quando um cliente insatisfeito liga querendo falar com o dono, este diz para os funcionários darem o recado que ele não está, passando assim uma mensagem que o cliente não é importante; enquanto que existem outros que assumem sempre a dianteira para atender melhor.
- Preocupação com a equipe:
Existem empresas que possuem grande preocupação com as pessoas que nela trabalham, que querem e lutam por um ambiente saudável e prazeroso de se trabalhar, que querem ser justas o tempo inteiro, que não aceitam funcionários que prejudiquem o ambiente coletivo; outras existem que humilham os funcionários, procuram se beneficiar não pagando determinados adicionais ao salário, além de não valorizarem as boas ideias vindas da equipe.
- Criativos:
Algumas empresas não hesitam em mudar, em permitir que a equipe inove, crie e modifique o que está implantado, considerando o que é evidente: o crescimento de uma empresa depende da velocidade da mudança. De outro lado, existem aquelas que são resistentes às mudanças, presas que estão ao passado, concentrando-se mais em manter o status quo do que em crescer.
- Assumir Riscos:
Algumas empresas assumem riscos calculados com mais facilidade, possuem mecanismos seguros para navegar em novas áreas, diferentes territórios, tecnologias ainda não dominadas completamente, assumindo o risco potencial do erro. Outras, no entanto, querem sempre o erro zero e desta forma só andam por terrenos conhecidos, em que dominam completamente o ambiente.
- Atenção aos detalhes:
Existem empresas que são detalhistas, não aceitam que um funcionário apresente um trabalho muito rasteiro, não se conformam com projetos superficiais, querem controlar os detalhes de tudo o que acontece na empresa, sentem-se mais confortáveis com os detalhes sendo monitorados.   Já outras companhias são mais generalistas: acham que o controle em detalhes faz a velocidade cair, acreditando, portanto, que os funcionários devem trabalhar mais soltos.
- Orientada para equipes:
Existem empresas que valorizam muito mais as equipes do que os indivíduos, que não hesitam em afastar da organização um profissional excelente como técnico mas que prejudica o trabalho do grupo, por considerarem que o todo é mais importante que a parte: neste contexto, a humildade de cada um é melhor do que a soberba. Ao passo que outras corporações valorizam a qualidade individual do profissional, promovendo competições internas entre as pessoas, acreditando que a rivalidade individual ajuda a empresa.
- Competitivas:
Existem empresas que são agressivas no negócio, que “partem para cima” do mercado, do concorrente e do cliente de forma dinâmica e ágil.  Enquanto outras empresas são mais dóceis e acomodadas, acreditando que a suavidade faz as coisas acontecerem sem estresse.
 
Isto posto, é importante identificar na lista acima como é a cultura da sua empresa, ajustando-a, se necessário, contribuindo para mantê-la, ajudando, inclusive, a orientar novos funcionários a aceitarem-na como um lema.
 
É por essa razão que algumas empresas são conhecidas por algumas de suas peculiaridades. Os administradores da Procter & Gamble fazem memorandos que não ultrapassam uma página. Todas as reuniões da Du Pont começam com um comentário obrigatório sobre segurança. O pessoal da Toyota está vidrado em perfeição.  A 3M tem dois valores fundamentais: um deles é a regra dos 25%, que exige que um quarto de suas vendas venham de produtos introduzidos nos últimos cinco anos; outro é a regra dos 15% que leva todo funcionário a despender 15% da sua semana de trabalho para fazer qualquer coisa que prefira, desde que relacionada com algum produto da companhia. A IBM leva ao máximo a sua preocupação com o profundo respeito aos funcionários como pessoas. Por essa razão, se diz que há uma cultura de segurança na Du Pont, uma cultura de serviços na Dell Computer, uma cultura de pessoas na IBM, uma cultura de inovação na 3M, uma cultura de qualidade na Toyota, pois as pessoas de cada uma dessas organizações aprenderam ali uma maneira particular de lidar com uma variedade de assuntos relacionados com a vida na organização.
 
Sendo assim, está correta a tese de Chiavenato na qual ele diz que a Cultura Organizacional é um iceberg, cuja parte visível é apenas uma pequena parte, ao mesmo tempo em que a parte submersa representa a maior parte do iceberg. O mesmo acontece no contexto de uma organização: a parte visível, pequena, é sustentada pela parte "invisível", que representa os fenômenos internos da empresa.
 
Isso quer dizer que é muito importante a cultura ser trabalhada no dia a dia, nas pequenas ações, nas mensagens muitas vezes subliminares que o líder está passando, eis que a cultura é transmitida muito mais pelas ações das pessoas do que nos treinamentos formais.  Importantes como sejam, os treinamentos constituem a pequena parte visível do iceberg, enquanto as ações diárias contribuirão para a parte gigantesca e submersa daquele. Não obstante, o que os autores invariavelmente não discutem são os resultados de uma empresa que está com todos alinhados em sua cultura, como:
- Vantagem competitiva derivada de inovação e serviço ao cliente;
- Maior desempenho dos funcionários;
- Coesão da equipe;
- Alto nível de envolvimento na busca da realização de objetivos.
 
É importante salientar que a formação da cultura se faz não apenas de maneira formal, mas também informalmente. Quando a empresa ministra treinamentos, faz conferência, corrige condutas, está criando cultura de maneira formal. Mas quando grupos de funcionários, jogando futebol no final de semana, criam conceitos e crenças erradas, estão construindo uma cultura alheia aos padrões da organização; quando um funcionário negativo e influenciador permanece na empresa poluindo a mente dos colegas, está prejudicando a formação da cultura correta.  Enfim, tem que ser papel da empresa não apenas gerar o conhecimento que quer, mas exercer vigilância preventiva com relação ao que não quer que aconteça.
 
Se você é o principal líder da empresa, ou mesmo gerente de um departamento, tenha certeza que as pessoas não aceitarão facilmente o que você pretende: você terá de demonstrar por suas atitudes e ações que é uma pessoa coerente, vale dizer, é preciso que haja harmonia entre o que fala e o que faz. Com efeito, você terá mais poder de passar a cultura da organização se tiver credibilidade frente ao grupo. Então, comece prestando atenção ao seu próprio comportamento.
 
Como atividade, faça uma lista das coisas que julga serem os valores culturais da sua empresa, mas não comente com ninguém. Peça aos membros da organização ou setor que você lidera para lerem este artigo e também fazerem as suas listas pessoais. Depois disso, marque uma reunião para escutar e confrontar as listas de todos. Com isso você terá oportunidade de começar a alinhar a todos numa filosofia central, começando assim o trabalho de padronizar a Cultura Organizacional da sua empresa.



Ladmir Carvalho
Diretor Executivo - Alterdata Software