Já ouvi muitas vezes a expressão que a vaca dá leite, como se pudéssemos ficar olhando e o leite saísse das tetas da mesma nos servindo sem qualquer esforço. O bezerro quando nasce aprende que uma das primeiras coisas importantes é saber que o alimento que o manterá vivo não vem sozinho, terá que esforçar-se para mamar, sugar e engolir o leite que está nas tetas da sua mãe, será uma lição importante que o seguirá por toda a vida.
Também nós quando precisamos de leite temos que ir até a vaca, temos que pegar nas tetas tendo a disposição e o conhecimento técnico para ordenha-la, só assim conseguiremos o alimento que estamos buscando, nada acontece sozinho, tudo depende de uma ação proativa.
Na vida também é assim que acontece conosco, mas mesmo assim, algumas pessoas não entendem que este comportamento de fazer acontecer é fundamental em tudo o que fazemos, principalmente no lado profissional. Conheço empresários que montam negócios e acham que a empresa dará o lucro sozinha, que ele não precisa esforçar-se em sugar este lucro das entranhas do negócio, e quando quebra, vão a falência colocando a culpa em algo que não seja ele mesmo. Também conheço profissionais que são bons técnicos e quando são promovidos a gerente acham que todos os integrantes do seu departamento produzirão sozinhos, jorrando a produtividade que está nas metas, ao invés de entender, que o gerente precisa sugar, puxar, retirar de cada integrante do grupo o resultado que ele precisa. O leite não sai sozinho, temos que extrai-lo, a empresa não dá lucro sozinha precisamos ter uma forte estratégia para fazê-la ser boa e lucrativa, os subordinados não produzem sozinhos, o líder tem que criar o ambiente para que isso aconteça, precisa medir as pessoas o tempo inteiro, precisa valorizar os melhores e retirar da empresa os piores. Mas tudo isso dá trabalho, exige esforço e concentração, o que nem todos estão dispostos em suas carreiras.
Na atual competição das empresas e dos profissionais, as pessoas que estão mais acostumadas a tirei leite de pedra são mais bem sucedidas, têm mais valor para as empresas aqueles profissionais que se esforçam para retirar o leite, que lutam para conseguir atingir os difíceis objetivos, pessoas que não acreditam que as coisas surgem sozinhas, pois quem faz uma empresa campeã são os líderes que esta empresa tem, e não a empresa em si. Isso foi previsto por Philip Kotler 1986, quando comentou em um dos seus livros que a liderança seria uma vantagem competitiva no futuro, pois o contexto da época era que se a empresa tivesse produto o cliente compraria, mas hoje a quantidade de alternativas para compra é maior do que a de clientes compradores, sendo fundamental entendermos que precisamos ordenhar o mercado, precisamos sugar o máximo de informações dos clientes para acertarmos mais, o cliente não vem sozinho, precisamos de esforço, trabalho e energia para fazer acontecer. Precisamos entender com exatidão o que o cliente espera de nossa empresa, mas o mesmo não falará sozinho, temos que sugar esta informação dele.
Como diretor e fundador da Alterdata Software, e lidando a 25 anos com empresários e executivos de alto nível, percebo que grande parte deles precisam de informações muito mais depuradas do que no passado. No início da Alterdata, os sistemas de gestão que produzíamos eram construídos para apresentar relatórios com dados a serem analisados pelos profissionais, que ficavam horas analisando e cruzando informações importantes para tomar decisões, porém hoje temos tecnologia para usar o Cockpit da Alterdata, gerando inúmeros painéis gráficos com relógios, marcadores, indicadores, mapas e muito mais, tudo com modelos matemáticos robustos para que o mesmo consiga entender em poucos minutos o que está acontecendo na empresa inteira. Estamos conseguindo retirar o leite um pouco mais fácil do que no passado, está sendo possível com menos esforço ordenhar a empresa para obter informações precisas, porém, outro desafio está se mostrando importante: as informações estão mais ricas, com mais volume e mais detalhadas, e com isso os profissionais precisam ser mais preparados para interpreta-las.
Estou observando que muitos empresários, executivos e gerentes não conseguem entender as informações que estão sendo disponibilizadas nos painéis de decisão porque não estão acostumados a trabalhar numa sala de controle, onde a companhia está sendo medida em todos os detalhes. Isso quer dizer que os profissionais que possuem a capacidade de gerir por instrumentos, por números, por indicadores, e que entendem que precisam se esforçar para interpretar as informações estão ganhando uma vantagem competitiva, estão compreendendo em primeiro plano o que devem fazer para acertar mais, enquanto outros profissionais lidam apenas com a sensibilidade, consertando apenas os erros que vão acontecendo, apenas apagando os incêndios que aparecem.
A expressão “vivo apagando incêndio”, que já escutei de muitos empresários, podemos fazer uma analogia como se o leite estivesse derramando o tempo inteiro, e ficássemos secando e colhendo o que conseguimos capturar. Quando derrama, perdemos grande quantidade de produto e aproveitamos uma parte do mesmo, mas quando estamos entendendo que não podemos esperar derramar, que é necessário criar um mecanismo para colher com eficiência o leite que está disponível na fonte geradora, tudo fica mais fácil. Precisamos entender que o líder tem que ser um profissional que analisa o tempo inteiro o que acontece a sua volta para estar sempre melhorando o que já está bom.
Se há na empresa um processo de coleta de informações para a tomada de decisão, se estas informações são granuladas para serem melhor compreendidas, tenho certeza que tudo poderá ser melhorado em algum momento. Enquanto alguns empresários sabem apenas quanto que a sua empresa está faturando, outros sabem o quanto este faturamento está distribuído por grupos de produtos, outros mais eficientes sabem o quanto este faturamento também está distribuído por regiões, e outros ainda conseguem mais, apurando quais cidades do país possuem mais sucesso nas vendas dos produtos, grupos, famílias, vendedores, enfim, conseguem coletar as informações antes que se derramem sem podermos aproveita-las, quanto mais conseguirmos coletar de informações na fonte geradora mais conseguiremos tomar decisões certas. Mas isso dá trabalho, muito trabalho, e apenas os dispostos a trabalhar conseguem sucesso.
Uma questão importante neste desafio é pensarmos na colocação do filósofo Rene Descartes onde afirma “daria o que sei pela metade do que ignoro”. Isso nos faz refletir no mundo empresarial gerando algumas perguntas:
- Será que tudo o que sabemos vale mais do que o que não sabemos?
- O que será que não sabemos que mudaria uma decisão que precisamos tomar?
- O que deveríamos saber que não sabemos para melhorar as decisões?
- Quanto esforço temos que ter para saber o que não sabemos?
- Como procurar algo que não sabemos, pois se não sabemos, não sabemos onde procurar?
São questões filosóficas que podem complicar a nossa forma de pensar, mas que podem nos colocar em outro patamar de qualidade quando solucionadas. O físico alemão Albert Einstein afirma que “o mundo não é movido pelas melhores respostas, mas sim pelas melhores perguntas”
Perguntar mais e mais para nós mesmos, para os subordinados, para os superiores, para os clientes, para os fornecedores, fará com que passemos a saber o que não sabemos, será uma forma de retirar o leite das tetas da empresa e do mercado para sobrevivermos, jamais podemos esperar que tudo caia em nosso colo pronto, pois isso não acontecerá. Profissionais e empresas de sucesso são aquelas que estão sempre insatisfeitas com a profundidade das informações que já possuem, são aquelas que querem saber o que não sabem para refinar as decisões e acertar mais, bons líderes aceitam subordinados que perguntam bastante, gostam de subordinados que discordam dele, pois tudo é uma chance de saber o que não sabe.
Para exemplificar com um caso real: Uma empresa tinha um crescimento regular de vendas de 10% ao ano e em determinado ano teve um crescimento de 30%, o que aparentemente era um momento de festa e comemorações, porém o líder eficaz sabe que é necessário granular as informações para retirar o máximo possível de detalhes do que está acontecendo. A tendência psicológica do ser humano é se apegar a tudo o que valoriza-o, e um crescimento de 30% ao ano é um número que alimenta o nosso ego, mascarando algumas informações que poderiam ser melhor depuradas. Neste caso em especial o líder solicitou ao respectivo gerente comercial que granulasse mais este crescimento por estado da federação, pois quando falamos de média de 30% podemos estar nos referindo a ter o estado com menor crescimento sendo 29% e o maior crescimento com 31%, ou, em outro cenário, podemos estar falando do menor crescimento sendo 4% e o maior 60%, o que seria uma outra forma de concluir. Quando esta informação maior foi quebrada em informações menores, percebeu-se estados da federação com crescimento muito pequenos e outros muito altos, o que gerou ações pontuais nos estados de menor resultado. Porém o líder não parou, queria ordenhar mais, e pediu para pegar os estados com maior crescimento e granula-los por vendedor, foi quando percebeu-se que num estado com crescimento de 60% haviam vendedores com crescimento muito altos e outros muito baixos, fazendo com que um plano estratégico de treinamento dos piores vendedores fosse feito. Mas o líder não parou, pegou os melhores vendedores de um estado ótimo, e granulou por linha de produtos, e com isso percebeu que um excelente vendedor tinha resultados bons numa linha de produtos e resultados ruins em outra linha de produtos, concluindo que precisava capacitar melhor este vendedor em certos produtos, dar mais informações para que fosse melhor ainda. Este caso deixa claro o quanto precisa sugar e torturar os números para que nos dê a informação que queremos com os detalhes que precisamos, pois nem sempre um bom número é o melhor que se poderia ter.
Neste caso acima, o número que sabíamos era 30% de crescimento, e o universo que não sabíamos eram os detalhes de cada vendedor, mudando assim, completamente, a tomada de decisão. Esta medida teve muito a ver com a frase de Gary Cohen da Columbia University: “Os bons líderes não dizem a seus colaboradores o que devem fazer: motivam-nos para agir com perguntas”.
Outro exemplo bem instrutivo que vi acontecer na Alterdata foi quando líderes das representações comerciais reuniram-se no congresso da empresa para questionar a diretoria que estávamos com problemas de preços num determinado produto, pois alguns concorrentes estavam nos batendo em função de ter produtos mais baratos. Neste momento, questionei que esta informação estava superficial demais para a tomada de uma decisão, que eu precisava de mais algumas respostas, como:
- Quais concorrentes são estes?
- Onde estes concorrentes estão atuando?
- Que pontos fortes e fracos estes concorrentes possuem?
- Qual a política de preço completa deste concorrente?
- Como eles conseguem demonstrar valor para os clientes?
- Que tipo de marketing estes concorrentes estão fazendo?
- O que está incluso nos preços destes concorrentes?
- Quais funcionalidades nos produtos dos concorrentes são melhores e piores do que as nossas?
- Quantas vendas perdemos por região e por motivo para estes concorrentes nos últimos dois anos?
- Quantas vendas ganhamos por região destes concorrentes nos últimos dois anos?
A princípio eles não tinham estas respostas, estavam argumentando baseados em sensibilidade, o que é inadmissível no mundo empresarial. Tão logo conseguimos as respostas chegamos a conclusão que tínhamos um produto melhor, preços melhores por ter mais coisas inclusas, que a perda não era tão grande quanto se imaginava, e a nossa falha estava no marketing que não estava conseguindo demonstrar valor para o negócio do cliente, o que gerou uma série de ações com excelentes resultados. Se eu tivesse me contentado com a informação inicial, certamente teria aceito que precisávamos ter menos margem de lucro para ter um preço mais competitivo, mas isso poderia afetar violentamente o poder de alavancagem da empresa no futuro. Desta forma alerto, jamais tome decisões com dados superficiais, lembre-se sempre que “a vaca não dá leite, temos que extrair da mesma com esforço”, raramente as informações chegam fáceis para uma correta tomada de decisão, precisamos trabalhar forte nos detalhes certos para então agir com mais assertividade.
Então vamos parar de teorizar, passe a agir na prática, passe a entender que você crescerá na carreira quanto mais valor agregar ao negócio, e desta forma quanto mais você demonstrar para sua empresa o que ela não sabe mais vital você será para esta companhia. Se você é o proprietário, executivo, líder geral da empresa, pense que você é o principal propulsor do ambiente exploratório que precisa haver na organização, você tem que ser a pessoa que faz todos perguntarem mais, indagarem mais, e não se contentarem com informações superficiais, você tem que criar uma cultura para todos pensarem da mesma forma que você, tudo começa com o seu comportamento.
O que estou querendo dizer é que o bom profissional não pode esperar alguém colocar o leite na sua boca, precisa ir onde a vaca está, precisa sugar para sobreviver. As informações estão disponíveis, mas precisamos ir atrás delas, precisamos saber extrai-las, temos que ter a disposição de pensar como captar melhor estes dados, o que se faz com perguntas, muitas perguntas, levantando questões o tempo inteiro, aprendendo o que não sabemos.
Como atividade final, sugiro que reúna-se com seus gerentes em grupo e peça a cada um para formular com calma, em casa, três perguntas que se houvesse resposta mudaria a forma de administrar os seus respectivos setores. Deixe-os pensar por uma semana, e faça uma nova reunião em grupo para que cada um exponha as suas perguntas. Isso fará com que todas as lideranças da empresa pensem juntos em quebrar as barreiras da companhia, sair da zona de conforto, e ao mesmo tempo formar um hábito nos líderes de pensar fora da caixa que estão.
Ladmir Carvalho
Diretor Executivo - Alterdata Software
A vaca não dá leite, temos que retirar o líquido dela